domingo, 10 de janeiro de 2010

adeus, avô Maurício

odeio hospitais, igrejas, capelas mortuárias, cemitérios e afins.
e, nos últimos nove meses, todas essas coisas têm feito parte integrante da minha vida. nunca pensei que num tão curto espaço de tempo tivesse de ter a mesma sensação duas vezes. um sentimento de deja vu, só que desagradável, desta vez.

poderia aqui dizer que ninguém, mas mesmo ninguém gosta destes sítios. mas não. há pessoas que só podem gostar. é que só podem. porque não há outra explicação para o facto de haver pessoas que vão visitar outras a hospitais, apenas com o intuito de contar as mazelas da sua própria vida, como se já não bastasse uma pessoa estar ali internada e sem paciência. não há outra explicação para o facto de haver pessoas que vão a velórios, e não largarem a viúva, ou os filhos da pessoa falecida, com histórias que não lembram a ninguém, com pancadinhas nas costas -ah, tão agora vai ficar sozinha lá em casa, não? -não, minha senhora, vou lá agora. o meu marido faleceu, mas estou lá em casa muito bem acompanhada. não há explicação para o facto de pessoas, que não são absolutamente nada ao falecido nem à viúva, nem a ninguém, usurparem os lugares ao lado do caixão, só porque ali há aquecedores (a igreja dos mortos, como é conhecida, é dos sítios mais gelados onde se pode estar, ainda para mais, tendo em conta que hoje já nevou em portalegre). e ali ficam, a comentar quem chega, aquela que era mulher do não sei quantos, mas que agora se amantizou com o fulano tal. o outro que parece tão boa pessoa, mas afinal fez não sei o que, não sei a quem. e por aí.
eu já me ria. já revirava os olhos. falava com a M. tipo esta gente não tem noção, yah? já bazavam, que já não as aguento. a M. olha para mim com o mesmo ar e ri-se também.

nestas alturas só quero sempre que chegue o dia do funeral, mesmo. para se acabar logo com tudo de uma vez.
tento aguentar o mais que posso sem chorar, mas no momento da verdade é sempre mais difícil.
vou tentar recordar sempre o sorriso dele, bem como as tontices que ele dizia e que faziam rir, as expressões basta que sim, ou estou a mangar contigo, entre outras. as idas à fonte dos amores para lancharmos, os jogos com as cartas dele, enfim. vou lembrar só as coisas boas, porque as más não interessam para nada.

e assim, já pode ir jogar à sueca com o avô Chico.

2 comentários:

isa disse...

Podia dizer-te que essas coisas só acontecem nos sítios mais pequenos, onde toda a gente se conhece e ir a um funeral é um evento social. Mas ia tar a mentir... "Pessoinhas" dessas há, infelizmente, em todo o lado.. daquelas que não sabem respeitar a dor. Mas isso não importa nada, talvez um dia aprendam quando estiverem a despedir-se dos seus queridos.
Sei que és forte, e sei que sabes que o teu avôzinho já merecia descanso. Onde ele estiver está certamente orgulhoso das netas que tem :)

Madame Butterfly disse...

Lamento imenso, querida P. Espero que voltes a sorrir brevemente. O teu avô iria gostar. E eu também.